Saudades do José Luís Silva

Foi graças ao Bento Bueno que nos conhecemos. O Bento sempre dava uma canelada na caixa da Toyo GX ao levantar da cama, anos a fio. Ele acabou decidindo vender todo o equipamento de grande formato e me pediu ajuda. Anunciei um monte de coisas do Bento num fórum, era o Esquina da Foto talvez. O José Luis Silva entrou em contato para comprar uma objetiva, talvez.

Sei que foi em 2012 porque o meu filho Felipe era recém nascido. E eu estava passeando com ele, falei que podia parar pelo estúdio e pegar a objetiva, o Zé falou que passava lá rapidinho para vê-la.

O Felipe tinha dormido finalmente quando cheguei ao estúdio. Deixei ele no carrinho e organizei as coisas do Bento sobre a mesa. O Zé chegou e viu o Felipe dormindo. Foi falando bem baixinho para me ajudar a mantê-lo assim.

Ele olhou as coisas que estavam a venda, nós começamos a conversar. O Felipe continou dormindo por mais de uma hora e nós ficamos amigos, ali, durante aquela soneca dele.

Penna Prearo, José Luís Silva, Elisa Bueno e eu. Fotografando em um ferro velho no interior do estado de São Paulo.

Tínhamos muitas das mesmas preocupações: como garantir a qualidade dos nossos trabalhos, como mostrar nossos trabalhos, como ganhar algum dinheiro com nossos trabalhos. Tínhamos visões diferentes na maioria desses assuntos, mas respeito mútuo pelos nossos esforços em seguir esse caminho.

E reconhecíamos o respeito de ambos pela fotografia em si. E nossas maiores dificuldades nesse campo também.

Obviamente o Zé levava as coisas muito mais a sério do que eu. O site e o Instagram deixam isso bem claro e vale uma visita agorinha, enquanto ainda estão lá. Tem um link quebrado no site, é uma pena, uma outra conta de Instagram que não existe mais, talvez.

Saudades das nossas perambulações pela Zona Leste de São Paulo e nossas caminhadas pelo Centro e por Higienópolis. Quando diminuiu meu tempo para sair e fotografar assim pela cidade, nossas ligações telefônicas continuaram. Ano passado, mesmo com a distância, pusemos em dia as fofocas fotográficas e as nossas conversas sempre francas… Porra, Zé, tão cedo!

Câmara caixote para filme 4×5″

Tudo começou com essa caixa de Ilford FP3 Series 2 que foi fabricado entre 1960 e 1968. Tinha achado ela em Biévres, em 2022, junto com outras tantas tranqueiras. Nem achei que tinha filme dentro, mas passou no raio-x do aeroporto e não fui chamado para inspeção, então, tudo bem. Dai deixei um ano aqui enquanto ganhava coragem para abrir, imaginando tudo que poderia ter ali dentro.

Enfim, vi que tinha filme mesmo. Na melhor das hipóteses esse filme tinha 55 anos de idade. Já meio ondulado e cheirando a vinagre, o acetato se desfazendo com o tempo. Queria usar, mas não tinha mais câmara 4×5″. Só tinha a Technika 13x18cm e não tinha como adaptar.

Minha mãe veio visitar e me trouxe um saco de outras tranqueiras que eu tinha deixado na casa dela. Tinha pedaços de um film holder 4×5″ e uns darkslides de outros, tudo separado para um futuro distante. Com paciência e uma faquinha jeitosa consegui montar um film holder razoavelmente funcional de partes diversas.

Com um caixote de vinho do Porto que peguei no lixo comecei a imaginar uma câmara fotográfica. Do lixo vieram também uns pedaços de madeira compensada, era da embalagem de algum eletrodoméstico grande. Cortei o compensado para fazer uma frente e uma traseira para o caixote, usei cola branca e paciência.

Optei por deixar a câmara com foco fixo, ali pelos 3 metros de distância, para o primeiro teste. Assim podia fazer umas fotos dentro da garagem e se desse certo poderia fazer retratos ou detalhes de ambientes como os que eu tinha feito com a 6×6 uns meses antes.

Fechei as frestas do caixote com massa corrida e pintei o interior de preto. Colei umas tirar de veludo na parte traseira e estava quase pronto.

A Cooke Primoplane de 155mm estava já num board para a Technika, usei cola quente para ameaçar ela ali na frente do caixote. Com um elástico segurei o film holder contra as tiras de veludo. Foi um tanto difícil colocar o filme no holder, a ondulação do filme impede que ele deslize facilmente para dentro.

Também não coloquei uma rosca no inferior da câmara poder usar tripé, nem sabia se o filme estava OK, não quis ter o trabalho à toa. Empilhei umas caixas na entrada da garagem e posicionei a câmara apontada para minha mesa de trabalho. Pela janela entrava uma luz fraca de um dia de inverno, a foto com o telefone dá impressão de muito brilho, mas não era tanto assim. Fechei o diafragma em f/11 e deixei a objetiva aberta por 30 segundos.

30 segundos em f/11

Agora no inverno a temperatura da garagem varia entre os 12C e os 14C, levei água quente da cozinha de casa e fiz um Rodinal 1:50 bem morno. Revelei por 2 minutos com agitação constante. Resultou um negativo pouco denso, mas com muitos detalhes nas sombras (se vê até o timer que está sob a mesa do Durst). Aparecem alguns pequenos pontos de mofo no filme, mínimos. Uma pena, podiam ser maiores.

Acho que agora se faz necessário passar um verniz rápido no caixote e instalar uma rosca na base para poder prender ao tripé. Contar quantas folhas sobraram e usar esse resto da caixa de filme.

Linhof Technika II 13x18cm • parte V

Continuo fazendo testes e vendo a melhor maneira de revelar o raio-x que tenho aqui. Na última saída por Braga, fui ao Largo da Senhora a Branca e depois ao Largo da Senhora da Boa Luz.

As fotos da Senhora a Branca foram reveladas num dia bem quente e a tentativa de encurtar o banho se provou muito equivocada. Céu escorrido, vários problemas de uniformidade.

Na revelação seguinte, mantive o tempo, mudei a diluição e o resultado apesar da temperatura alta, foi mais agradável.

Linhof Technika II 13x18cm • parte IV

Há umas duas semanas, num sábado, finalmente carreguei filme nos chassis e sai para fotografar com essa Technika pela primeira vez. Escolhi o centro de Braga e depois também subi na capela de Guadalupe, de onde tirei essa imagem que segue.

Algumas coisas deram muito certo, outras deram muito errado. Sem parassóis nas objetivas tive alguns problemas de flare, ainda não estava bem treinado para usar minhas placas pretas como obturador, acabei revelando as chapas um pouco demais e criei alguns negativos bem densos.

Por outro lado foi um prazer imenso voltar a revelar coisas, principalmente numa caixa assim tão improvisada.

Após avaliar tudo que fiz nesse primeiro dia, adicionei mais uns itens na minha lista de pendências e deixei algumas anotações para o próximo processamento de imagens.

Os parassóis chegaram da China e logo instalei nas objetivas. Aqui fica também o registro em imagem do problema com o anel frontal da petzval. Depois tampei esse furo com cola quente preta, para evitar invasões do Sol.

Consegui parassóis para a petzval e para a G-Claron no AliExpress, também improvisei um jeito de prender um na Aldis. Para a objetiva Primoplane ainda preciso construir um sob medida.

Uns dias mais tarde sai para um outro teste, dessa vez fui ao Bom Jesus do Monte.

Continuei fazendo umas besteiras com o obturador manual, mas já senti alguma melhora. Esses problemas só não são visíveis nas imagens que eu publiquei porque no processamento digital é fácil corrigir se o erro não for grave. Mas às vezes o erro é tão brutal que não há solução. A dificuldade é expor filme ISO 200 sob o Sol com uma objetiva que é f/4 fixo, por exemplo. Fazer 1/500 de velocidade exige destreza.

Comecei fotografando as costas da Basílica com a Aldis Anastigmat, em f/45, consegui controlar bem a exposição e acho que fiquei feliz com o resultado. Braga ao fundo, o céu ainda guarda detalhes apesar do filme ortocromático.

Depois tentei uma foto dos jardins, mas essa realmente ficou tremendamente super-exposta e nem consegui um bom scan dela.

Na sombra das árvores, pedi ao Pedro Viana para posar para uma fotografia. Usei a petzval e consegui controlar bem a obturação. Para quem não viu as entrevistas da série Fotografia Portuguesa, o Pedro é um fotógrafo a la minuta (lambe-lambe em PT-BR) que trabalha no Bom Jesus.

Depois por fim, fotografei o coreto lá no alto do Bom Jesus com a Aldis novamente, em f/32.

Depois desse passeio, adicionei mais uns itens à minha lista de pendências, pequenas coisas para consertar e que vão me ajudar a fazer exposições mais curtas quando necessário. E conto dos avanços no próximo update.

Linhof Technika II 13x18cm • parte III

Continuei a caixa-laboratório. Achei uma promoção de sweat shirts do Notorius Big na Primark, acho que isso era da coleção anterior. Assim a caixa ganhou mangas, usei cola quente preta para fazer isso em 20 minutos, mas acho que é suficiente.

Depois tentei desamassar o anel de filtro da minha petzval, mas isso não correu bem, nem vou colocar foto aqui. É provável que o parassol 72mm que eu comprei e que está a caminho fique bem nela, mas um pedaço do anel quebrou.

Superada essa dor, passei à próxima tarefa: medir o foco no infinito para as 4 objetivas que pretendo usar e fazer furos que permitam o standard frontal travar no lugar certo.

Optei por fazer só 3 dos 4 furos necessários agora e ver se consigo usar o da 150mm para a 155mm.

Por enquanto é isso. Faltam 3 tarefas para limpar minha lista: aguardar a chegada dos parassóis; providenciar um pano preto para ver o despolido, focar e compor; providenciar duas jarrinhas graduadas para medir os químicos na hora de misturar.

Linhof Technika II 13x18cm • parte II

Nota: ao longo das minhas pesquisas descobri que estava enganado com relação ao modelo da câmara que eu tenho aqui. As informações sobre Linhof pré-1945 são muito confusas, mas achei alguma coisa aqui. Descobri que tenho mesmo uma Technika II ao invés de uma Standard como me havia sido informado. Corrigi os posts o melhor que pude.

Para revelar as chapas da nova Linhof pensei uma caixa simples como laboratório, já que ainda não disponho de um ambiente que possa ser transformado. Essa também é a opção mais barata.

Tinha um pedaço de compensado que imaginei como base da caixa. Achei duas garrafas grandes de detergente que poderiam ser convertidas em bandejas de revelação (tinas em PT-PT). O papelão veio do lixo reciclável, como as garrafas. A opção seria usar gatorfoam/k-line, mas sairia caro e não sei quanto tempo a umidade da garagem levará para deixar a caixa inutilizável. Bandejas de 13x18cm da marca AP custam entre 3,5 e 5 euros novas, talvez seja um investimento necessário se os filmes começarem a grudar no fundo dessas bandejas improvisadas.

Não tenho água corrente na garagem. Terei que levar a água necessária para o processamento e trazer tudo sujo de volta a cada para lavar. Terei que lavar as chapas em casa também. Cortei uma garrafa maior para fazer um balde onde vou depositar tudo que estiver usado.

Pintei a caixa por dentro e encomendei Rodinal e fixador rápido pelo correio, chegou bem rápido. O vinagre de limpeza veio do supermercado. Ainda falta visitar a loja da Cruz Vermelha e procurar um moletom preto do qual eu tirarei as mangas para instalar na frente da caixa de revelação.

Também cortei um pedaço de acrílico (recuperado de um monitor quebrado) para proteger o vidro despolido dentro da mochila.

Com ajuda de cotonetes, fiz uma super limpeza nos trilhos da parte frontal da Linhof e coloquei graxa nova ali (massa da lítio em PT-PT).

Vou continuar a resolver essas pendências da maneira mais econômica possível e assim que as próximas etapas estiverem concluídas, conto aqui!