Réveillons

Tem um projeto nasceu praticamente ao mesmo tempo em que comecei a praticar à fotografia. Isso foi lá no início dos anos 1990, mais precisamente no dia 1 de Janeiro de 1993. E fiz fotos para esse mesmo projeto até os primeiros dias de 2018.

Esse grupo de imagens reflete diversos detalhes do meu processo criativo: a ausência, o silêncio, os recipientes (que guardam materiais como fronteiras entre o seco e o molhado) e os lampejos (que simbolizam eventos irreprodutíveis). Acredito que o foco central é a ideia de ciclos que se encadeiam, já que retrato a fronteira entre eles: o réveillon.

1994

Meus réveillons sempre foram momentos de vazio. Faltava alguma coisa. Meu estado de espírito não acompanhava a alegria ao redor. Assim, essas ocasiões tornaram-se momentos de reflexão e introspecção, em vez de festa e celebração. Desde a adolescência, minhas caminhadas tornaram-se minha atividade preferida durante a semana do evento, afastando-me da festa que se fazia onipresente.

2016

No Natal de 1992, ganhei uma câmera. Trouxe-a para dentro desse ritual. Ao longo dos 25 réveillons seguintes àquele Natal. Fotografei, pensei sobre tudo que vivi e ainda desejava viver. Com a câmera, encontrei nuances diferentes nestes dias do ano: um compasso de espera, quase uma angústia, um sofrimento, um toque de ironia e um rompimento com o que passou. Esses detalhes estavam presentes nas celebrações de alguma forma; faltava apenas reconhecê-los.


Já faz uns anos que eu penso nesse projeto, escrevo e reescrevo sobre ele. Já fiz algumas candidaturas para prêmios, na tentativa de organizar uma exposição ou um pequeno livro com ele. Nada vingou ainda, mas eu não esqueço dele e continuo tentando. Esse post inclusive nasceu porque fiz uma candidatura recentemente e fiquei pensando nessas imagens mais uma vez. Provisoriamente esse trabalho ou que quer que nasça dele se chamará Réquiem. Junto a Travessia e a Lampejos, outros dois grupos de imagens, esses trabalhos são os mais representativos da categoria Fotografia no que eu fiz até hoje.

O próximo post nesse blog me obrigou a criar uma nova categoria aqui. Que serve também para organizar algumas coisas que eu já fiz, mas que andavam por ai descategorizadas. A nova categoria ganha dois posts de 2008 e um de 2010. Ah! Os projetos que levam anos para encontrar uma saída, é bom finalmente ver certas coisas acontecerem.

Em busca de uma solução para misturar cores, anos, assuntos

Da Wikipedia: https://en.wikipedia.org/wiki/R%C3%A9veillon

Comecei a pensar nesse livrinho sobre os Réveillons em 2016. Eu já tinha o hábito de registrar em imagens o feriado da virada desde 1993. Organizei uma pasta com esses negativos, escaneei tudo, tratei. Depois achei os anos em que tinha fotografado em digital, juntei tudo.

Nunca tive um jeito certo de fotografar, nem escolhia exatamente o assunto. Só fiz isso no primeiro, dia 31 de dezembro de 1992. Sai de casa lá pelas 21h e fui ver quem estava nos botequins do bairro. Fiz um rolo de Tri-X puxado nessa noite. Nos anos seguintes simplesmente fotografava o que estava ao meu redor. Dia 31 de dezembro de 1996 estava em Piracicaba, voltava do supermercado com um amigo, com os itens da ceia. Nos deparamos com uma rua que tinha sido inundada pela chuva da noite anterior. Os morados estavam fazendo o rescaldo.

Existem infinitos réveillons, às vezes a vida simplesmente acontece durante a virada do ano, por mais que a intenção seja parar, refletir ou celebrar.

Minha grande questão agora é como editar todas essas pequenas histórias e fotos únicas num livro. Minha primeira tentativa foi juntar duplas de imagens que conversassem entre si e compor essa sequência de duplas independente de cronologia ou de quantas imagens representam quais anos. Me pego implicando com as diferentes proporções dos negativos ou arquivos, me pego implicando com fotos coloridas justapostas a fotos monocromáticas.

Queria encontrar outras referências de livros que também contém diferentes momentos, visualidades dispares, convivendo em harmonia lado a lado.