Laboratório da Tabapuã #1

No idos de 2004 fotografei o meu laboratório na época para um revista inglesa especializada em preto-e-branco. Já não tenho mais esse laboratório, nem metade das coisas, fui doando meus ampliadores para outros interessados, o espaço foi minguando. Mas encontrei as fotos hoje e resolvi comentar algumas coisas.

O lado seco era esse. Uma bancada com os ampliadores menores e uma mapoteca com os dois maiores sobre ela. O lab era totalmente branco, a luz de segurança ao invés de direta, era rebatida do teto, o que a tornava mais fraca, mas dava menos sombras, demorava mais para se acostumar, mas funcionava melhor para mim e não velava os papéis. O pequeno armário no chão era um caixote com 4 rodas e ia para onde ele fosse necessário.

O banco é extremamente útil para esperar o ampliador fazer o lance dele. Os ampliadores eram os seguintes: dois Durst (M605 Color 6×6 e M800 6×9), um Omega D5 4×5″ e um Elwood 5×7″. O Elwood é um ampliador bem antigo, não funciona nem por difusão nem por condensação. Ele possui um refletor de metal que foca a luz no negativo através de um vidro despolido que funciona como um filtro anti-vignetting. As prateleiras no canto esquerdo, sobre a mesa guardavam as lentes e livros de referência. As prateleiras guardavam os papéis – é possível que apenas umas duas caixas desse papel todo estivesse ainda na validade. Do lado direito a porta que dava para o resto do ateliê.

Virando para a esquerda um detalhe da janela com o fechamento de madeira compensada (um Ventokit instalado nas placas que fecham a janela não era o sistema de exaustão ideal, mas resolvia). Para esquerda começa a parte molhada.

Um pedaço da parte molhada, as lâmpadas voltadas para o teto. Um gaveteiro ao fundo guarda os tanques de revelar filmes, na prateleira os químicos e mais um carrinho/caixote sobre a bancada.

E por fim a parte ainda mais molhada, garrafas com químicos, bandejas e um pequeno tanque daonde vinha toda a água usada. Encostados na parede, sobre a bancada, ficavam placas de polietileno e de acrílico com as receitas e anotações mais usadas no lab, era um jeito de organizar a informação para leitura no escuro, rapidamente, mesmo com as mãos molhadas.

Diafilme

Em 1997 fui a Curitiba por conta de uma matéria de jornal. Tive um fim de tarde livre e sai para passear ao redor do hotel. Achei uma lojinha muito interessante de fotografia com coisa que não via em São Paulo. Aquilo ficou guardado.

curitiba

Estive por lá no fim da semana passada e tentei repetir o trajeto do passeio, reencontrei a Diafilme Materiais Fotográficos perto da Pça da Ordem, ali na Travessa Nestor de Castro, 255 loja 08. Para minha surpresa a loja ainda mantem alguns apetrechos para laboratório nas suas prateleiras e também alguns papéis fotográficos difíceis de achar por aqui.

Roletes da Colex

Dentro da processadora existe uma série de roletes. Eles servem para fazer o papel passar de uma ponta da processadora até a outra, entrando e saindo dos diversos banhos químicos que ficam ali aguardando o papel.

roletes

A esquerda um rolete danificado na extremidade, onde falta o eixo em aço inox. A direita um que apesar de usado ainda está completo. O eixo de inox além de cair ainda deixou um tanto de químico entrar para dentro da estrutura do rolete, e tem um tanto de ferrugem que se criou lá dentro. Primeiro então enchi o espaço dentro do rolete com Ferrox (que reduz a ferrugem) e deixei agir. Agora ele está secando na janela, vou deixar isso rolar por uns dias antes de usar araldite para colar outro eixo de 3/16″ de polegada no lugar do antigo. Na falta de aço nessa especificação resolvi improvisar o eixo com um pedaço de broca de furadeira que perdeu o fio.

Colex em processo

Triste ler o comentário da Juliana no post sobre a FSP.

A Colex existe desde 1971 lá nos EUA. A processadora que tenho aqui é uma Colette.

Para confundir, a Colenta também fabrica processadoras, lá na Áustria.

Até o momento o que fiz com a minha Colette foi um bom banho de mangueira e detergente nas partes laváveis. Depois penei para montar todas a partes de entrada do papel, que veio desmontada. Entender é tudo.

Um dos racks de roletes estava desmontando, demorei um pouco, mas acabei descobrindo o que ia aonde e consegui remontá-lo.

Construi um carrinho com rodas para processadora morar em cima.

Passei um tempo observando a profusão de mangueiras no interior da processadora, tentando entender o que cada uma faz. É díficil. Já providenciei o manual em PDF pela internet, mas a coisa é demorada.

A maioria dos tanques veio sem as tampas que fecham os canais de esgotamento, já descobri qual a rosca dessas tampas e vou providenciar algumas para poder fechá-los (são niples simples de meia polegada, a princípio).

Um dos roletes da máquina está com uma ponta quebrada. Isso vai ser um pouco mais complicado de consertar. Entro com mais detalhes e fotos em breve. Por enquanto fico feliz que vieram todos.

Essa foi a parte fácil. Agora começa o realmente complicado. Checar mangueiras, repor as que estiverem cortadas ou faltando (algumas foram removidas quando a máquina foi colocada de lado). Penso em limpar melhor o fundo da processadora.

Só então vou poder encher a máquina de água e ver se a parte elétrica está operacional. Não dá para ligar uma bomba d’àgua sem água no tanque. Só então os piores problemas podem aparecer. Estamos falando de um emaranhado de fios em meio a mangueiras, várias bombas hidráulicas, sensores de temperatura e movimento, ventoinhas, aquecedores de água e ar, ah! Tudo ligado em 220V.

Imagino que gastando umas 2 horas por semana até o fim do ano eu revelo alguma coisa nessa máquina.

Lab da Folha

A presença da Colex no meio do estúdio e o cheiro dentro dela me fizeram pensar em alguns eventos e personagens do passado.

Entre 1997 e 2000 eu passei um bom tempo na sala da Fotografia da Folha de S. Paulo. Eu fazia uns frilas e volta e meia me via ali esperando os filmes revelarem, esperando cópias, esse tipo de coisa. O lugar era sempre agitado. Ali conheci dois personagens em especial, o Vailton e a Luciana.

A Luciana operava um pequeno minilab (só impressora) que transformava os negativos 35mm usados pelo pessoal em cópias 15x21cm bem rudimentares. O porta-negativo havia sido recortado com uma lima para mostrar todo o conteúdo do negativo na cópia. Luciana se esmerava controlando densidade, amarelo, magenta e cian das cópias. A lente do minilab não cooperava e as fotos sempre tinham um foco que deixava a desejar, eu me sentia o único a perceber aquilo, então nunca falava nada.

Luciana era conhecida por ali pelo seu linguajar único e peculiar, que enquanto parecia uma barreira para se chegar a ela, logo se mostrava uma maneira diferente de conhecer o mundo. Ela sentada ali na máquina, voltada para a janela do lab que dava para a sala, observava a ida e a vinda de fotógrafos e mais fotógrafos, todos com suas bolsas e egos “com ou sem catupiry”.

Vailton rodava todo o setor, supervisionava tudo. Trazia consigo a experiência de quem já havia visto a passagem do p&b para o cor e por ai vai. Com ele se conseguia filme, ou seja, você trazia 6 filmes usados na pauta e entregava para ele, ele já te dava 6 virgens para a próxima. Sem filme exposto, sem filme virgem.

O lab da Folha tinha uma parte de clara que fazia a forma de um “U”, na sala de entrada Luciana e sua impressora, a saída da processadora de papel em folha, os escaninhos, no meio o estúdio e escondido nos fundos o lab de filmes.

No interior do “U” ficava um lab escuro com dois Leitz Focomat 35mm. De lá saiam pela processadora as cópias mais refinadas que a Folha Press, por exemplo, usava para vender imagens e também todos os contatos em papel 24x30cm que os jornais todos usavam para editar e arquivar suas fotos. Eu ficava de papo com a Luciana olhando o que saia pela processadora e caia na cesta. Seu som era interessante e de vez em quando não saia nada e logo alguém percebia que um papel tinha ficado preso lá no meio. Um contato importante era aguardado com ansiedade. Eram muitos contatos e no fim do dia as caixas de 24×30 vazias se empilhavam. Eu levava as caixas vazias embora e as usava para guardar os meus printfiles com meus filmes p&b revelados em casa.

Um dia, ali mesmo, ao lado do minilab, perguntei ao Vailton o que eram uma série de envelopes amarelos antigos sob a bancada que dava para os scanners do fundo da sala. Eram papéis fibra p&b do passado da Folha, papéis para ampliações 30x40cm que eram feitas ali no lab, envelhecendo ali no chão. Ganhei esses papéis de presente e com eles fiz a exposição de Osasco no CCSP (1998).

CCSPosasco02

Certa vez pedi uma pesquisa no arquivo atrás de todas as pautas que eu tinha feito por lá. Juntei uns filmes escolhidos e parti para aquele mesmo lab cor com uma caixa de papel que comprei no centro, passei uma manhã de domingo tranquilo no lab da Folha ampliando meu próprio portfolio. Vailton me mostrou o básico do lab cor e eu me virei pela primeira vez com o cheiro da processadora e o calor da chapa metálica onde se apoia o papel na hora de colocá-lo lá. As cópias saiam secas e os olhos deles dois serviam de balizas para encontrar o tom correto e as dicas de quantos pontos de magenta deveriam entrar e quantos cian deveriam sair.

carreteiro

zoo

ginasta

Lab cor é uma experiência muito prazeirosa com uma boa processadora fazendo todo o trabalho difícil. Essa vez na Folha foi a primeira, depois tive essa oportunidade uma vez no Canadá, num desses labs que se aluga por hora e depois no Senac algumas vezes nos idos de 2004 e 2005. A Colex de Uberlândia promete momentos de nostalgia num futuro próximo.