Deve fazer uns dois anos que eu achei um projetor no lixo. Acho que por ele só ter uma entrada VGA deixou de ter utilidade, não havia errado com ele, nem a lâmpada estava velha (coisa que é comum). A resolução era baixa, apenas 800×600 pixels (SVGA).
Eu tinha essa ideia de fotografar alguns objetos com um grid projetado neles, sei lá, olhar para as linhas e para os limites, não sei bem, talvez seja apenas a intersecção das formas.
Mas foi essa semana que sobrou um tempo extra, tirei o carro da garagem, montei um estúdio improvisado ali, levei o projetor, liguei um laptop antigo, fiz um grid adequado. Experimentei com o tempo, com a altura do projetor, com o ângulo etc.
Fiz umas imagens com o smartphone para testar, enquanto faço uma lista mental dos objetos que pretendo fotografar.
O primeiro teste ficou escuro, é difícil fotometrar essas linhas e saber como vão aparecer num filme sensível a luz verde. Acabei optando por colocar um difusor sobre a luz da minha mesa de trabalho e deixar ela ajudar nos volumes (que é a foto que abre esse post).
Essa Nikon D100 veio parar aqui já há um tempo. Até que um dia me deparei com um vídeo no Youtube mostrando como é simples remover o filtro IR cut da frente do sensor. É razoávelmente fácil desmontar a câmara. Na foto abaixo, os quatro parafusos que se pode ver na beirada do sensor podem ser removidos para libertar o filtro azulado e pronto, está feito.
Já tinha testado a câmara com uma bateria e sabia que ela ligava. Mas não tinha bateria, nem queria comprar uma para esse projeto. O projeto tinha que ser mais barato que isso, me tornei essa pessoa.
Comecei a pesquisar e descobri que a Nikon fazia um adaptador chamado EH-5 para ligar a D100 direto à tomada 110/220v. Num post do dpreview achei até informação do pinout do adaptador, além da informação principal: 9v e até 4amp.
Na minha sucata tinha um carregador da Sony que veio do lixo também. Tem saída 8.4v e vai até 1.7amp. Me pareceu próximo o suficiente para um teste. Os plugs de ambos eram bem diferentes, no entando era possível encostar um no outro e fazer contato entre os polos corretos. Assim a câmara ligou sem problemas.
Dobrei um pouco os metais do contato da câmara e forcei o plug do adaptador um pouco mais longe, não encaixou mas ficou sob pressão. Envolvi tudo em cola epóxi e com uma fita hellerman prendi o cabo ao ponto de fixação da alça, para evitar que um puxão desfizesse tudo. Deixei a cola secar um dia.
Seguia pensando o que poderia fazer… Sem o filtro IR cut no lugar, era provável que não fosse mais possível focar a câmara no infinito. As primeiras imagens ficaram totalmente rosadas, efeito do IR atingindo todo o sensor.
Separei um canto ao lado da janela e posicionei minha aloe vera iluminada pelo céu azul. Coloquei a câmara no tripé, compus a primeira imagem e então rosqueei o filtro IR 850nm na objetiva. O filtro é opaco para a luz visível, nada se via pelo visor então. A câmara não tem live view. Comecei a fotografar e analisar o resultado, localizar o ponto de foco, ajustar a composição e tentar novamente. Fotografei essa aloe vera em f/8 com velocidades de 1/2s a 1/8s em ISO 200.
Logo percebi que algumas imagens tinham uma pequena barra preta no canto inferior esquerdo da imagem vertical. Parece que o obturador está dando sinal de que vai chegar ao fim. Em alguns outros momentos o obturador simplesmente não abriu completamente, expos só uma faixa. Bom ficar de olho e checar todas as imagens antes de partir para a próxima.
Cheguei a testar um filtro Wratten 87 (segundo a Wikipedia “Blocks wavelengths shorter than 740 nm”), mas gostei mais das imagens com o 850nm, por enquanto.
Virei a câmara para a janela. Fiz uma imagem em f/16 e 1/25s com o mesmo ISO 200, sucesso em obter foco no infinito com a objetiva 50mm, pelo menos.
E depois me diverti com a sinuosidade da rua aqui em frente de casa, com a grama brilhante, enfim, coisas do infravermelho.
Em breve chega do AliExpress um filtro IR Fader que vai de 530nm a 750nm, espero que funcione, queria testar umas imagens em comprimentos menores, entre 600nm e 720nm. Depois conto mais dessa próxima etapa.
Tudo começou com essa caixa de Ilford FP3 Series 2 que foi fabricado entre 1960 e 1968. Tinha achado ela em Biévres, em 2022, junto com outras tantas tranqueiras. Nem achei que tinha filme dentro, mas passou no raio-x do aeroporto e não fui chamado para inspeção, então, tudo bem. Dai deixei um ano aqui enquanto ganhava coragem para abrir, imaginando tudo que poderia ter ali dentro.
Enfim, vi que tinha filme mesmo. Na melhor das hipóteses esse filme tinha 55 anos de idade. Já meio ondulado e cheirando a vinagre, o acetato se desfazendo com o tempo. Queria usar, mas não tinha mais câmara 4×5″. Só tinha a Technika 13x18cm e não tinha como adaptar.
Minha mãe veio visitar e me trouxe um saco de outras tranqueiras que eu tinha deixado na casa dela. Tinha pedaços de um film holder 4×5″ e uns darkslides de outros, tudo separado para um futuro distante. Com paciência e uma faquinha jeitosa consegui montar um film holder razoavelmente funcional de partes diversas.
Com um caixote de vinho do Porto que peguei no lixo comecei a imaginar uma câmara fotográfica. Do lixo vieram também uns pedaços de madeira compensada, era da embalagem de algum eletrodoméstico grande. Cortei o compensado para fazer uma frente e uma traseira para o caixote, usei cola branca e paciência.
Optei por deixar a câmara com foco fixo, ali pelos 3 metros de distância, para o primeiro teste. Assim podia fazer umas fotos dentro da garagem e se desse certo poderia fazer retratos ou detalhes de ambientes como os que eu tinha feito com a 6×6 uns meses antes.
Fechei as frestas do caixote com massa corrida e pintei o interior de preto. Colei umas tirar de veludo na parte traseira e estava quase pronto.
A Cooke Primoplane de 155mm estava já num board para a Technika, usei cola quente para ameaçar ela ali na frente do caixote. Com um elástico segurei o film holder contra as tiras de veludo. Foi um tanto difícil colocar o filme no holder, a ondulação do filme impede que ele deslize facilmente para dentro.
Também não coloquei uma rosca no inferior da câmara poder usar tripé, nem sabia se o filme estava OK, não quis ter o trabalho à toa. Empilhei umas caixas na entrada da garagem e posicionei a câmara apontada para minha mesa de trabalho. Pela janela entrava uma luz fraca de um dia de inverno, a foto com o telefone dá impressão de muito brilho, mas não era tanto assim. Fechei o diafragma em f/11 e deixei a objetiva aberta por 30 segundos.
30 segundos em f/11
Agora no inverno a temperatura da garagem varia entre os 12C e os 14C, levei água quente da cozinha de casa e fiz um Rodinal 1:50 bem morno. Revelei por 2 minutos com agitação constante. Resultou um negativo pouco denso, mas com muitos detalhes nas sombras (se vê até o timer que está sob a mesa do Durst). Aparecem alguns pequenos pontos de mofo no filme, mínimos. Uma pena, podiam ser maiores.
Acho que agora se faz necessário passar um verniz rápido no caixote e instalar uma rosca na base para poder prender ao tripé. Contar quantas folhas sobraram e usar esse resto da caixa de filme.
No último post, ficou uma pendência: abordar as janelas da garagem e a questão da luz de segurança. É sobre isso que venho escrever hoje.
Quando instalei o ampliador na garagem, questionei-me sobre como poderia mantê-la escura o suficiente para trabalhar. Ao mesmo tempo, percebi que durante a noite, a única luz que penetrava pelas janelas era a proveniente das lâmpadas da rua de trás. Essas lâmpadas são de vapor de sódio, assim como a luz de segurança Thomas Duplex. A Wikipédia tem uma imagem bacana da emissão espectral dessas lâmpadas.
E se? Não tomei nenhuma medida em relação às janelas da garagem, na esperança de que a luz disponível fosse segura e suficiente para o trabalho. Na primeira noite em que usei o ampliador testei essa hipótese com papéis de grau fixo. Embora a luz seja segura, a quantidade que entrava era tão pequena que precisei usar uma fita de LEDs vermelhos para conseguir realizar acompanhar visualmente a revelação.
Outra dúvida surgiu em minha mente: a luz da rua afetaria o filme IR-F que ainda tenho para cortar e usar na câmera 6×6? Num certo dia da semana passada, desci até a garagem e cortei um pedaço de filme utilizando apenas a luz que entrava pela janela. Teve até alguns carros passando pela rua de trás em busca de uma vaga para estacionar. Em alguns minutos consegui fazer 5 rolos de 120 com um pedaço de 86cm, um trabalho rápido graças a iluminação. Testei dois desses rolos no dia seguinte e os revelei como de costume. A base veio limpa, sem véu – um sucesso absoluto!
A luz de segurança da cidade! Bom, não sei por quanto tempo. Muitas aqui no bairro já foram substituídas por LEDs brancos.
Nota: IR-F é um filme da IBF para imagesetters que utilizam laser infravermelho. Já falei nele aqui diversas vezes, seguindo o tag é fácil encontrar os outros posts relacionados.
Há uns meses eu havia decidido construir um caixa de ampliação, ou seja, um ampliador pequeno instalado dentro de uma grande caixa de madeira.
A ideia era aproveitar o espaço da garagem para ampliação sem ter que ter muito trabalho para escurecer o ambiente e etc.
Tinha conseguido uma caixa, fiz uns suportes para ela e estava em busca de um pequeno ampliador que pudesse doar a cabeça e talvez a coluna para o projeto.
Já estava desanimado com aquilo tudo quando me escreveu o Samuel da Bestacameras. Ele viu uns stories e me falou do Durst 138S que ele estava vendendo. Conversamos um pouco, uns dias depois eu dirigi até a Espanha para buscar o tal ampliador e tudo mudou.
Cheguei de volta a Braga, limpei e montei o Durst no único canto da garagem onde ele cabia. Comecei uma lista de afazeres e itens que eu precisaria providenciar para fazer essa história funcionar. Decidi começar tudo pensando que seria possível usar o ampliador durante a noite sem ter que vedar janelas e portão da garagem.
Do lixo saiu um pouco de madeira e espuma para fazer o porta-negativos, depois uma tábua de passar roupas que cortei para ser marginador com imãs do AliExpress.
Também achei um bidão que cortei para ser uma tina. Ao invés de focalizador de grão, uso um óculos de leitura bem forte que permite ver a imagem de perto na superfície do marginador. Uma fita de LED RGB ligada na cor vermelha serve de luz de segurança (sobre as janelas da garagem e a luz de segurança farei um post mais detalhado em breve).
Precisava soda cáustica e hidroquinona para fazer meu revelador preferido para papéis antigos. A soda achei no Leroy Merlin, a Hidroquinona veio de uma loja de fotografia analógica na Bélgica.
Nesse tempo todo fiquei pensando em quão improvisados eram meus primeiros laboratórios e de como fui ajeitando e fazendo as coisas ao longo dos anos. Tive laboratório de 1992 a 2019 e voltar a ter as coisas “do jeito que dá” é mesmo libertador.
Durante esses últimos quatro anos eu sonhava com meu último laboratório e todos os luxos e conveniências que eu tinha nele. É difícil reprogramar a cabeça para funcionar num espaço tão improvisado, mas parece que vai ser divertido.
Já estamos em pleno Outono e acho que não vou conseguir usar esse laboratório tanto antes da Primavera, mas vou indo e vou vendo.
O primeiro papel que decidi experimentar era um envelope quase vazio de Kodabromide W2 com aparência dos anos 1980.
Serviu pelo menos para mostrar que tudo funcionava. A imagem apareceu em foco, o revelador funcionou e não houve velatura grave. Minha ideia, por mais incrível que pareça, deu certo. As lâmpadas de vapor de sódio da rua de trás do prédio iluminam dentro da garagem, mas não velam o papel. Os carros que passam não deixam a garagem clara demais por tempo demais.
A primeira imagem feita nessa laboratório, manchas pequenas de onde os pedacinhos de hidroquinona mal diluída encostou no papel, velatura da idade pela borda da folha. Os imãs do marginador não deixaram sombra!
Ainda fiz mais uma tentativa com esse mesmo papel, mas não consegui resolver a questão do véu. Resolvi testar outro papel. Esses envelopes de Ilford Galerie em que a palavra “Galerie” está carimbada na etiqueta, são os primeiros a chegarem no Brasil. Isso deve ser de 1992 ou 1993.
Sempre tive muito sucesso com esses lotes bem antigos de Galerie. Esse não foi muito diferente. Com o mesmo revelador consegui uma imagem mais contrastada, mais pretos e menos véu. A base ficou bem cor creme.
Mas pequenos detalhes entregam a vida pregressa dessa folha.
Uma digital aqui, uma mancha ali.
Esse dia meus pensamentos ficaram em torno do que ainda vale a pena fazer num laboratório p&b. Existem tantas coisas hoje em dia que se resolvem mais facilmente com um arquivo digital e a impressão em carbono. Usar esses papéis antigos e lhes dar oportunidade de intervir no processo é algo que ainda faz sentido para mim.