Laboratório de Fotografia Experimental

Dentro do Serviço Educativo da Plataforma do Pandemónio existe o NÉBULA que é o Centro de Criação Comunitária, ali habitam alguns Laboratórios Criativos, entre eles o Lab de Fotografia Experimental que eu coordeno. São encontros quinzenais que começaram em Outubro e vão até o fim do ano letivo. E que vão acontecer no PISO.

Entramos agora no último mês do primeiro trimestre e resolvi escrever aqui um pouco sobre as quatro primeiras aulas que tivemos.

Aula 01

Nossa primeira aula foi num dia ensolarado. Estava de olho na previsão do tempo e resolvi começar por aprensetar as pessoas ao processe de formação da imagem através de uma lente biconvexa.

É um jeito bacana de começar a pensar na parte experimental da fotografia (pelo menos eu acho). Acho que derruba algumas barreiras ver que um pedacinho de vidro quase insignificante consegue projetar uma imagem. Que a imagem fica de cabeça para baixo. Que basta ter uma caixa de papelão e chamá-la de câmara.

Aula 02

Para a aula seguinte achei fixe pensar em algo que fosse realmente simples de fazer. Algo que pudesse ser feito com um app de smartphone, algo que os apps das câmaras dos smartphones na sua maioria já permitem fazer automaticamente.

Coloquei minha Canon 10D com um Arduino a fotografar pela janela do PISO e fizemos inúmeros registros das pessoas passando pela rua em frente. Montamos esse timelapse em Kdenlive numa máquina rodando Linux MX, tudo software livre.

É uma técnica que pode ser complexa, mas ao mesmo tempo é acessível com os dispositivos que carregamos no bolso todos os dias, achei um bom ponto para tocar já no início do lab.

Aula 03

Nesse caminho caótico, voltamos para algo super antigo e analógico: qumigramas. Os participantes exploraram diferentes pressões sendo exercidas sobre o material, combinações de revelador e fixador, sequências diferentes, foi uma diversão imensa!

Sim, tem uma lumen print ali no meio, é verdade! No meio da confusão, me perguntaram sobre o escurecimento do papel enquanto trabalhávamos e como tinha muito Sol esse dia, resolvi mostrar o que é possível fazer sem químicos!

Usei uma prensa que eu fiz há uns 3 ou 4 anos, com restos de uma portas de armário de coxinha que apareceram na minha rua e um vidro de scanner.

Aula 04

Na quarta aula voltamos ao digital de uma maneira muito familiar para mim, começamos uma série de aulas nas quais pretendo apresentar os scanners para os alunos. Nessa aula ainda não desmontamos nada muito importante, apenas usamos o scanner de maneiras diferentes das habituais.

Espuma de sabão, uma flor, uma lanterna que pisca. O que mais precisamos para fazer belo? Aqui pudemos tomar contato com algumas propriedades interessantes dos CCDs, entender um pouquinho os problemas de White Balance na fotografia digital.

Fizemos inúmeros scans de objetos brancos. Expliquei que tinha a ver com a aula de amanhã, mas ainda não revelei o que faremos amanhã. Conto no próximo post sobre o lab!

Atividades participativas

Tudo que eu queria nesse dia era achar uma apresentação que fiz para uma aula de história da fotografia em 2009.

Acabei encontrando tudo que ficou guardado do meu envolvimento com a rede Metareciclagem e com o coletivo editorial Mutirão da Gambiarra. Achei algumas edições do MutSaz, uma publicação trimestral do Mutirão para registrar o que se discutia e pensava nessas redes. Relembrei os vídeos que fiz para o projeto MicroMetragens. Achei coisas que eu fiz para ajudar aqui e ali, como por exemplo, essa fotografia. É uma fusão de duas imagens, minha mão entrega um tijolo para minha outra mão. Os tijolos que são passados para o andar de cima pelos que vieram ajudar, uma ação entre amigos, um mutirão.

E assim fui relembrado das coisas que não entendi tão bem dessa época. Eu implicava muito com o nome das coisas, que não eram tão claros para mim. Havia toda uma linguagem (linux, esporos, conectazes, etc) que me mantinha fora das conversas. Hoje olho para trás e acho que podia ter insistido um pouco mais.

Do que resta do site do Mutirão da Gambiarra, eu reproduzo uma espécie de glossário para duas palavras:

Gambiarra – expressão brasileira que define qualquer desvio informal de conhecimentos técnicos. É uma prática cultural composta por todos os tipos de soluções improvisadas para os problemas cotidianos, viabilizadas com qualquer material disponível. É uma boa definição para a vontade de transformar criativamente o que se quer ou precisa, explorando a tecnologia. Gambiarra é uma solução edificada entre o limite do “temporário” e do “definitivo”. Entre seus processos estão tentar, observar, aprender e tentar novamente. Uma condição instável, que permite grandes doses de inovação espontânea.

Mutirão – forma tropicalizada da multidão, que reúne pessoas, sempre que solicitado para realizar objetivos maiores, como por exemplo: construir uma parede, limpar de uma casa, colocar lâmpadas em uma rua ou qualquer coisa. Quaisquer que sejam as diferenças pessoais, as pessoas tendem a ver o Mutirão como um esforço coletivo para um bem maior, que suspende temporariamente as tensões. O Mutirão geralmente não possui hierarquias. Cada um contribui como quer ou pode, e muitas vezes o resultado é satisfatório. Pode ser visto como uma forma muito produtiva para uma comunidade para atingir objetivos comuns.

https://mutgamb.github.io/conteudo/SobreAbout.html

Mas, ao mesmo tempo que eu senti essa dor de ter abandonado esse projeto, provavelmente porque 2010 foi o ano mais cansativo da minha vida em termos de trabalho, eu acabei sendo relembrado de uma outra atividade participativa essa semana:

Sim, a FRoFA continua firme e forte, e agora eu (ou minha alma que foi roubada) sirvo apenas para ilustrar os posts. Isso é muito bacana, a Beth Lee e o Labirinto tocando mais uma edição – um bazar de Natal muito maneiro! De cá surge todo tipo de pensamento, até uma egotrip ou outra, mas é legal ver que uma comunidade que o Massao e eu criamos ainda vive e serve a fotógrafos da maneira como ela foi idealizada, não se quer mais nada nessa vida!

PISO • Inaugurado

Ontem foi a inauguração do PISO. Um espaço independente gerido por suas associações de artistas: Plataforma do Pandemónio e Astrolábio Itinerante e idealizado pelos dois presidentes dessas associações a Marta Moreira e eu, respectivamente.

Há seis anos, quando eu chegava aqui, uma das coisas que mais de deixou perplexo era como a cidade com o segundo festival de fotografia mais antigo da Europa não tinha um laboratório comunitário, um núcleo de fotografia ativo, nada.

Ao longo desse tempo fiz diversas tentativas de reverter essa situação, mas nada tinha ido adiante ainda, a não ser pelo TiroLiroLab. Recentemente fui convidado a contar a história dessa iniciativa social e reproduzo o texto aqui:

Num aniversário da Tatiana que surgiu a ideia de nos juntarmos para montar um laboratório. Dois cinquentões que chegaram até aqui por caminhos diferentes — ela pela ciência, eu pela arte — mas que sempre tiveram a tecnologia como território partilhado.

Ciência, tecnologia e arte encontravam-se no nosso desejo de criar um espaço divertido e focado na inclusão tecnológica, atento aos saberes tradicionais e comprometido em reduzir o lixo eletrônico. Ficamos superempolgados e inscrevemos o TiroLiroLab no Programa de Aceleração da Human Power Hub. Foi uma experiência interessante, que ajudou o nosso projeto a amadurecer e crescer, até esbarrar em algumas limitações.

Elaboramos uma estratégia para lidar com a ausência de um espaço próprio (um laboratório de fato) e fomos investigar o que poderíamos fazer nessas condições.
Logo fomos selecionados para o Programa ISA da BragaHabit. Tatiana e eu conseguimos executar as atividades propostas a partir daquilo que já havíamos criado no TiroLiroLab, aproveitando a infraestrutura da HPH e a nossa criatividade. Depois do ISA, decidimos fundar uma associação que desse ao laboratório mais tração.


Fomos ao IRN em Guimarães e estávamos ali a consultar a lista oficial de denominações já validadas para associações. Tartaruga Disruptiva nos pareceu muito bom e humorado, mas demos uma busca pelas letras “lab” e, dentre as opções que apareceram, estava disponível Astrolábio Itinerante.


Uau! Que nome! Consigo trazia todo tipo de sugestão para dois imigrantes que gostam de ciência e tecnologia: a ideia de orientação e descoberta, a navegação por territórios novos, a invenção de rotas próprias num lugar que ainda estávamos a aprender a habitar.


Enquanto a associação ainda estava em processo de criação, candidatamo-nos ao programa Todo-o-Terreno da Braga25. Nosso projeto consistia em organizar 10 exposições de fotógrafas experimentais na Padaria Amor & Farinha. Assim nascia outro caminho dentro da associação, mais ligado à minha experiência na disseminação da fotografia.


O programa Todo-o-Terreno foi um encaixe perfeito para essa fase sem laboratório e/ou oficina, já que teríamos de propor algo para um espaço que já existia — e soubemos muito bem escolher essa padaria.


Mas o sonho sempre foi ter um laboratório com luz vermelha para imprimir fotos em papel; uma bancada onde pudéssemos construir circuitos eletrônicos que gerassem sons e desvendassem os primórdios da música eletrônica; um canto com alguns computadores para programar, em software livre, sites e apps…

Depois de muitos cafés e muitos bolos, ao longo de um ano letivo do Nébula, as conversas convergiram nesse sonho comum. E que agora tem nome e morada: Piso, Rua do Cabido, 7 — primeiro andar.

Assim terminava o texto. E agora com o PISO finalmente inaugurado, com programação publicada no site, é começar a agitar coisas.

Mas como nasceu o PISO?

Há um tempo atrás respondi uma chamada do Nébula (Plataforma do Pandemónio) para apresentar uma proposta para o recém formado núcleo de artes visuais. Isso acabou possibilitando uma série de conversas e ideias, mas que sempre esbarravam na falta de um espaço físico disponível (se possível com um canto escuro e água corrente). Mas por outro lado revelavam a capacidade de organização e de gerir a comunicação que a Marta tem.

Nesse último verão começamos a falar mais sério sobre isso, porque já se aproximava a segunda temporada do Nébula. E começamos a procurar espaços pela cidade. Fizemos um plano de sustentabilidade, cálculos de tudo que poderia dar mais errado.

Dai a Marta viu esse papel na janela de um primeiro andar exatamente ao lado da Catedral da Sé de Braga. Uma casa centenária, no caminho oficial para Santiago de Compostela, com muitas janelas, uma vista incrível para o ponto mais movimentado da cidade. Nossos olhos brilharam e nos deixamos sonhar. E ainda estamos sonhando!

A bateria analógica do Eko Madrigale

Aos poucos foi ficando evidente que o orgão inteiro era volumoso demais para os espaço que eu tenho disponível. As idéias foram se acumulando e eu acabei optando por explorar maneiras de usar as partes mais interessantes dele.

Ainda com o órgão em funcionamento, usei um fio ligado a um aplificador para detectar de quais placas vinham quais sinais de áudio. Fui fazendo minhas anotações e analisando as possibilidades.

A parte da bateria é bem simples: uma placa gera uma série de pulsos em ritmos que podem ser modificados através de botões, uma outra placa serve apenas para aplicar um envelope aos pulsos, dando a eles um som específico de um instrumento.

A placa com tons de verde gera os pulsos e a placa castanha produz os envelopes. Achei 7 entradas na placa castanha e liguei um soquete banana a cada uma delas. Na placa verde localizei os ritmos e juntei fios a eles.

Fiz ainda uma série de experiências e percebi que são necessárias duas entradas distintas para criar o som de certos instrumentos. Encontrei também alguns pontos onde é possível fazer um bending desse circuito que gera pulsos.

Reduzi bastante as partes que usei para alimentar o circuito. Achei um DVD no lixo com uma fonte maneira e acabei por eliminar um 7805 e um transformador enorme. Coube tudo lá dentro e agora esquenta menos. De fora ficou a placa de uma bateria de criança que resolvi adicionar, mas isso ainda está sendo trabalhado, para que os pulsos disparem essa bateria também.

Julho e Agosto foram meses muito quentes aqui e acabei escondido na garagem fazendo essa e outra traquinagens. Para curtir os primeiros momentos com essa drum machine analógica, gravei uma faixa ruidosa que carinhosamente entitulei Onde de Calor.

20 anos do blog Refotografia

Para contextualizar, o que acontecia há 20 anos:

  • eu tinha acabado de completar 30 anos. Agora já faz 50 anos que eu nasci. Como diria o Cazuza, o tempo não pára.
  • eu estava no meio do bacharelado em Fotografia, tinha muito tempo para pensar na fotografia dentro da minha vida. Tive a idéia de usar o blog para estruturar os textos que eram o início do que eu escrevia para o meu trabalho de conclusão de curso.
  • eu tinha uma Canon 10D e ela era bem nova!
  • a Nikon estava a lançar a D200, que me deixou um pouco desapontado com a Canon 10D.
  • o Ubuntu havia acabado de estrear, mas eu ainda não sabia.
  • os computadores da Apple ainda usavam processadores PowerPC.

Sobre o blog em si:

  • Olho os posts antigos e vejo que quando eu comecei eu estava numa fase de evitar usar as letras maiúsculas no início das frases. Achava isso “engraçadinho”.
  • Esse blog nasceu na plataforma Blogger/Blogspot, depois importei todos os posts originais para a plataforma WordPress, tanto é que o primeiro de todos está aqui.
  • Teve uma época do blog que eu voltava aos posts mais antigos e dava títulos a eles. O primeiro template que eu usei não incluia títulos para os posts, era mesmo apenas um template para web log. Depois eu mudei de template e resolvi adicionar títulos. Ainda não terminei de dar títulos aos primeiros posts.
  • Nesse meio tempo a internet criou o tl;dr (too long, didn’t read) – um sumário para os posts, para quem tem preguiça de ler. Ainda não me convenci que isso também fará parte dos meus posts mais longos, como esse.

Ao longo desses anos, muitos materiais em estados muito “interessantes” passaram pelas minhas mãozinhas. Ah! Que delícia!


Essa imagem do cometa Neowise tem várias camadas para mim. Ela já havia aparecido no blog quando eu a capturei. Morar numa cidade em que da varanda do seu apartamento você consegue uma imagem dessas, sem aquela poluição à qual eu estava acostumado em São Paulo, foi uma grande mudança. E isso é uma das camadas que eu vejo. Viver num mundo onde há informação sendo distribuída sobre ciência nessa quantidade é outra camada. Eu acordei com um despertador para uma hora exata, sabia a direção em que olhar e o que procurar, isso é fabuloso. A informação deveria existir quando comecei o blog, mas não era tão fácil de ser acessada e calculada para as minhas coordenadas específicas. Na boa, com a tecnologia que existe hoje eu podia até ter continuado dormindo e programado um ESP32 para operar o obturador da Canon por mim, mas eu sou velho e acredito em passar frio na madrugada!


Nota: Esse post está agendado com 10 meses de antecedência, para ser postado nessa data comemorativa. Espero estar vivo para ver! Ha! Enquanto estiver, vou entrando aqui e escrevendo um bocadinho mais.


Estou terminando o primeiro ano do Mestrado em Media Arts na Universidade do Minho. Em um dos trabalhos do primeiro semestre, acabei esbarrando em um livro de um autor chamado Garnet Hertz. Vou falar mais dele depois, mas o fato é que ele me fez voltar a pensar no Flusser, na caixa preta e em temas relacionados. Decidi escrever um pouco mais sobre isso e criar algumas caixas pretas físicas para representar essas reflexões.

Falar desses 20 anos do blog é também refletir sobre o que escrevi aqui e sobre o que tenho imaginado para o futuro.

Hoje em dia falamos tanto de IA, e ela é a maior caixa preta de todas. Mal dominamos seus inputs e outputs, e poucas pessoas realmente a conhecem por dentro — menos ainda sabem exatamente quais são os critérios adotados na sua criação e manutenção.

E, falando em critérios, acho que raramente nos damos conta de como eles são importantes. Vamos a um supermercado e compramos um saco de maçãs selecionadas. Voltamos para casa felizes. Mas, espera aí! Selecionadas? As maiores? As menores? As mais maduras? As que têm bicho dentro? E se a única seleção for o diâmetro da maçã? De que adianta?

Nesses 20 anos escrevendo sobre imagens, acabei esbarrando nessas questões com certa frequência. Uma fotografia é um elogio? Uma crítica? Quais os critérios que definem isso?

Até certo ponto, eu tentava responder a essas perguntas listando fatores relacionados ao processo de formação da imagem. Afinal, as decisões e os critérios do fotógrafo norteiam as visualidades que estarão presentes na fotografia. A fotografia digital, nesse sentido, não trouxe tantas novidades em relação ao mecanismo herdado da fotografia analógica, e é relativamente fácil traçar paralelos.

No entanto, a produção de imagens via código traz uma certa insegurança nessas relações. Acho que ainda é tudo muito novo para que eu consiga perceber se poderemos continuar usando um sistema de paralelos e equivalências para entender essas imagens.


tl;dr (too long, didn’t read, ha!) – Olhando para trás, comecei escrevendo principalmente sobre fotografia, mas neste último ano me vi cada vez mais envolvido com o som. É curioso como é essa tal crise de meia-idade: em vez de um carro esportivo, investi em equipamentos de som baratos. É interessante perceber como a gente muda com o tempo — e como as paixões se transformam e se multiplicam. Acho que isso tem muito a ver com o fato de, ao me envolver mais com o código, ter descoberto outras maneiras de transformar as imagens e os sons em experiências novas — como se cada linha de código abrisse caminho para paixões que eu nem sabia que tinha.

Quem sabe nos próximos dias eu crio coragem e escrevo sobre os magnetofones de rolo que estou trazendo de volta à vida lá na minha garagem!

Luxúria, de Pedro Bastos

Luxúria, do artista Pedro Bastos, é uma exposição-instalação apresentada em três museus do Norte de Portugal: o Museu Nacional Soares dos Reis, o Museu do Abade de Baçal e o Museu de Alberto Sampaio. A abertura inclui a exibição do filme “Luxúria”, uma projeção analógica em 35 mm com música ao vivo de Rui Souza.

O projeto é inspirado por iconografias medievais da luxúria presentes em esculturas religiosas da região, o trabalho desenvolve uma leitura contemporânea e poética desses temas, combinando pesquisa literária e fotográfica.

O filme projetado foi impresso com serigrafia, quadro a quadro. Imagina o trabalho que isso deu!