No século XIX a mãe do meu bisavô veio morar no interior de Minas Gerais. Leocadie Procureur, Vovó Leocádia como era conhecida, largou a facilidades de Bruxelas, pegou muita estrada de terra no interior do Brasil e chegou a Itabirito, que mal existia. Seu marido brasileiro fundou a Usina Esperança que tinha uma produção importante e quase única no Brasil daquela época: ferro-gusa. O irmão mais novo da Vovó Leocádia, Charles Procureur ficou na Bélgica e teve um filho, Jean, amante de flores, fotógrafo amador, engenheiro fascinado por um produto tão novo na Europa do século XX como o gusa no Brasil do XIX, o plástico.
Na década de 1930 Charles morreu. A situação na Europa não era das melhores e Jean iniciou correspondência com sua tia Leocadie, decidindo mudar para o Brasil com mulher e dois filhos, um menino e uma menina. Vovó Leocádia chegou a oferecer pouso em Itabirito, mas Jean preferiu ir em direção ao pólo industrial brasileiro da época, São Paulo, com seus conhecimentos em plástico e formação de engenheiro.
Jean se estabeleceu na zona oeste da cidade, próximo ao Parque da Água Branca e só finalmente em 1955 consquistou cidadania brasileira. Nesse meio tempo construiu uma pequena manufatura de brinquedos de plástico e se divertiu com a fotografia no seu tempo vago, chegando a fazer alguns trabalhos.
Sua técnica e sua composição eram apuradas. Suas paixões foram sempre os cisnes e as orquídeas, mas seus assuntos giravam em torno de tudo que havia a sua volta. Seu arquivo (que conheci agora em Belo Horizonte) guarda uma enormidade de experimentos fotográficos, estéticos e eróticos. Sua câmara apontava com desejo em várias direções: a cidade que crescia a sua volta, as mocas bonitas do Brasil, os filhos brincando no parque.
Para Jean, com suas próprias fotos, eu fiz um jardim.
